Comentários

A Invenção de Hugo Cabret (Martin Scorsese, 2011)

– por  Allan Kardec Pereira

Esse Hugo de Scorsese figura não apenas como um testemunho do amor pelo cinema que nutre o já experiente diretor, mas também, é um filme sobre o (s) encanto (s) possíveis através do cinema. Pois, Scorsese vai na raiz da mágica no cinema, no ilusionista que passa do teatro de variedades até o recém inventado cinematógrafo e injeta-lhe boas doses de mentira, sonhos e imaginação. Méliès foi um sopro de inovação e encantamento à sétima arte semelhante às possibilidades do 3D. O paralelo de Scorsese, nesse caso, mostra que o diretor está perfeitamente atento às novas tecnologias, afinal, Hugo é o grande filme a usar tal efeito.

A história se passa em uma estação de trem na Paris dos Anos 30 e conta a história de Hugo (Asa Buterfield), um jovem órfão que vive acertando os relógios dessa estação e que está sempre tentando roubar peças de brinquedo da loja de  Georges (Ben Kingsley), que certo dia acaba lhe roubando um caderno – que, junto com um autônomo desativado, é a única herança deixada por seu pai (Jude Law). O menino se junta com Isabelle (Chloë Moretz), afilhada de Georges, e agora  tentarão descobrir quais os segredos que Georges e aquele misterioso caderno guardam.

Nesse processo, nas constantes fugas de Hugo do chato inspetor da estação (Sacha Baron Cohen), há o grande mérito de Scorsese em explorar o 3D. Hugo passeia por aqueles labirintos de engrenagens dos relógios e a câmera o acompanha com um travelling semelhante a já famosa sequencia de Goodfellas (http://www.youtube.com/watch?v=3Sr-vxVaY_M. Na resolução do mistério, onde o jovem vai entender a ligação do enigma deixado por seu pai aos filmes de Georges Méliès, o agora melancólico dono da loja de brinquedo e outrora primeiro grande cineasta, Scorsese imprime um tom didático ao filme. E daí porque, a sedução do olhar de Asa Buterfield/Hugo ser tão próxima ao diretor, já que o personagem lembra bastante as aventuras de Scorsese descobrindo o cinema em sua infância complicada em Nova Iorque. Sedução que também é nossa, na medida em que a didática metalinguística de Scorsese revela a magia do ilusionista Méliès e todo aquele cinema se descobrindo.

Se Scorsese já nos levou por uma “Viagem pelo Cinema Americano” e nos presenteou em sua “Viagem à Itália”, em Hugo o cineasta nos leva ao nascimento do ilusionismo da sétima arte. Em seu documentário sobre o cinema americano, ele fala com entusiasmo dessas possibilidades, em Hugo tal condição se materializa no 3D. Se em “O Aviador” víamos um Howard Hughes e sua megalomaníaca paixão por aviões e cinema e suas potencialidades de invenção, aqui em Hugo, o diretor vai até os primórdios do cinema e traz uma aventura espetacular em torno desse invento. O tempo, aspecto importantíssimo do filme, é matéria de trabalho, de concerto, de luta do jovem Hugo e do velho Scorsese. Ele passa, esquece uns tantos e glorifica outros mais. Scorsese entende perfeitamente a função da lembrança no decurso do tempo, afinal ele é também uma das personalidades decisivas na criação do The Film Foundation, que desenvolve projetos (culturais e económicos) de conhecimento, revalorização, restauro e difusão do patrimônio cinematográfico, tendo já recuperado muitos filmes “perdidos”. Não tem como não pensar  Hugo como um filme-manifesto, um prolongamento dessa empreitada, celebrando o verdadeiro amor pelo cinema, pelo fazer cinema.

5/5

Ficha-Técnica: A Invenção de Hugo Cabret (Hugo) – Estados Unidos, 2011. Dir. Martin Scorsese. Elenco: Asa Butterfield, Sasha Baron Cohen, Jude Law, Ben Kingsley, 


4 comentários em “A Invenção de Hugo Cabret (Martin Scorsese, 2011)

  1. li o livro A invenção de Hugo Cabret e confesso que nao vi o filme.mas ainda lendo mi vi viajando e admirando cada pagina.tudo sem cor m atrevi e colori alguns capitulos. o ratinho azul ficou lindo…mto lindo…

  2. acho que Hugo está sofrendo com uma superestimação calculada. homenagem ao cinema – sim; mas é desastrosa a forma com a qual o scorsese tenta atingir isso: através de um conto não-inspirado sobre um garoto que perdeu seu pai e busca seu lugar no mundo. aliás, e a morte do pai? falando de coisas aleatórias e sem sentido.

    além do mais eu acho que pesaram a mão na questão cinebiográfica, o epílogo mostrando a famosa exibição feita em homenagem ao méliès era dispensável e foi articulada com uma doçura irritante. enfim, não faço ideia do que as crianças vão achar. suponho que vão gostar de uma parte do filme (exatamente aquela que eu não gostei).

    obs: pra mim, todos os filmes do scorsese são uma homenagem ao cinema.

Deixar mensagem para Fábio Visnadi Cancelar resposta