– por Michael Barbosa
A história é conhecida: Guerra Fria, Caça às Bruxas, americanos bastante paranóicos, aquele lance todo sobre comunistas que comem criancinhas, mas nesse caso não dava pra evitar, um filho de imigrantes russos fazendo um filme sobre como as empresas podem ser antros da exploração e, mais ainda, sobre como os sindicatos são o único meio de salvação dos trabalhadores explorados, tudo isso embaixo dos narizes da indústria, era petulância além da conta. Sobraram dedos na cara de Martin Ritt chamando-o de comunista e traidor, mas Norma Rae se provou maior que a polêmica e, certamente ajudado pelo fato de o macartismo já havia se dissipado no fim dos anos 70, Martin Ritt conseguiu sair quase ileso disso tudo e o que ficou marcado foi o discurso forte e Sally Field incrível como nunca.
A história é a de uma tecelã interiorana, promíscua e desencontrada, que tem a sua vida cruzada por intelectual judeu afim de instalar na cidadezinha um sindicato e disso tira um meio para se reencontrar na vida e parar de dar por aí para homens casados. Colocar as coisas desse jeito é legal para deixar bastante claro que sobre certo ponto de vista Norma Rae é sim maniqueísta, ao longo da trama vamos ver certas cenas que evitam tirar do sindicato o caráter republicano da coisa e Ritt faz questão de jogar dois líderes sindicais estúpidos lá pelas tantas para evitar um endeusamento irrealista, no mais é sobre como o sindicato é uma instituição hábil a ser a salvação não apenas profissional como também moral e espiritual do sujeito.
O que se tem além de esquerdismo transbornando é um cineasta capaz de trabalhar bem todo o potencial explosivo do seu discurso extraindo dele o máximo, fazendo da personagem central, não menos que brilhantemente interpretada por Sally Field, uma heroína vil e carismática, um misto de ‘mulher interrompida’ e inteligência reprimida pelo machismo do meio. “Union” é transformado num grito de guerra e Norma numa personagem complexa e complicada e cheia de pormenores.
O espírito imposto ao filme por Ritt é mais ou menos aquele alcançado por Jean Vigo em Zero de Conduta, é sobre arquitetar, lutar e e chegar lá, a ascensão da esquerda, da luta da classe reprimida. E no momento derradeiro, quando a vitória for consumada, soltar o grito preso na garganta e gozar sim da vitória.
É difícil, ainda hoje, discordar dos que acusaram Norma Rae de folhetim de esquerda. Ainda que não fosse o objetivo final do filme (e sinceramente creio nisso), Ritt tinha plena consciência do que dizia e de como dizia e do tanto de TNT que tinha ali. Que ótimo, nesse idealismo todo Norma Rae é um grande filme, grande em saber ser contudente no discurso como poucas vezes em Hollywood.
4/5
Ficha Técnica: Norma Rae (Idem) – EUA, 1979. Dir: Martin Ritt. Elenco: Sally Field, Beau Bridges, Ron Leibman, Pat Hingle.
18 de abril de 2011 at 18:27
maravilhoso esse folhetim supostamente revolucionário aí, vi outro dia no telecine cult. acho que essa coisa de esquerda e direita tá tão em descrédito, que dá pra ver norma rae mais como esse chamado pra mobilização anti exploratória das empresas. não se trata de esquerda, mas de auto estima mesmo. tem que ser visto hoje, todos os dias antes de ir pro trabalho, se possível, isso sim
19 de abril de 2011 at 0:54
Eu acho que a coisa de direita e esquerda não vale mais hoje, mas até por isso tentei fazer uma contextualização ali pra justificar meu enfoque nisso… 79 ainda tinha Guerra Fria, ainda tinha o mundo polarizado entre capitalistas e socialista e direita e esquerda ainda funcionavem bem como conceitos de posicionamento político…
19 de abril de 2011 at 13:46
Cara, esse filme é praticamente lúdico. Sally Field encantadora na pele da funcionária que não se dobra diante do sistema. Martin Ritt é um diretor fantástico!